Filipe Augusto Santos*

Imagine um homem gigante. Ele vive numa casa gigante, assiste a uma TV gigante, deita num sofá gigante e é lógico, tem problemas gigantes. Mas bem, como tudo ao seu redor está em proporções absurdas, ele não consegue perceber, nem se dar conta de sua grandeza. Pois é. O Brasil é assim.

 

Existe um conto que lembras essas coisas. Em "As Viagens de Gulliver", o protagonista, um indivíduo totalmente comum, na verdade até subestimado por seus conhecidos, um dia se perde e vai parar numa terra onde todos os habitantes são seres minúsculos, e justamente por essa condição, o consideram um gigante, e assim, nessa terra,  ele passa a mostrar o seu valor para os pequenos habitantes e eles o agradecem, e ele é tratado como um incrível e bondoso Deus.

O nosso Estado é assim. Mas ao contrário.  É um gigante também, mas não se curva para ajudar os pequenos e frágeis habitantes daqui. O Brasil só se porta com humildade quando está diante daqueles que são maiores do que ele, naquela forma de bajulação moderna a que foi dado o nome de "relações internacionais", em que abaixamos a cabeça e abrimos o sorriso, as portas (e porque não dizer também as pernas?) pr'aquele que pagar melhor. Mas no resto do tempo, o Brasil é um gigante no mínimo apático, quando não arrogante, que pisa e maltrata os frágeis (leia-se mulheres, crianças, índios e professores).

O Brasil é aquele homem que posa de bom marido no jantar chique na Embaixada, mas que quando chega em casa vai espancar sua mulher e seu filho. Aquele cara que paga de rico na coluna social, e que vai comer quanto caviar puder, pra não abrir as latas de sardinha, que são tudo que ele tem em casa. É um gigante que está dormindo e está cercado de pernilongos que estão chupando seu sangue, e não se incomoda, desde que eles não atrapalhem o seu sono, vocês bem sabem. Sabem que é um gigante preguiçoso, que quando finalmente acorda, usa uma força desproporcional e desnecessária para matar um mosquitinho. 

Sim, o gigante acordou, mas não levantou do sofá.

O gigante Brasil assistia ao telejornal deitado no seu sofá gigante e com a longa duração do bloco que contava as notícias de corrupção, ficou de saco cheio e apático que é, acabou pegando no sono no sofá ouvindo a televisão, que a gente sabe, é o sono mais pesado que tem. Quem sabe que horas ele vai acordar... Quem sabe quando ele ouvir que vem aí os gols da rodada.


*Graduando em Direito pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI
Categoria: Crônicas | Visualizações: 511 | Adicionado por : Negreiros | Data: 2013-09-03 | Comentários (1)

Em 2010, o Instituto Alana encaminhou uma notificação à representante McDonald's no Brasil _ Arcos Dourados Comércio de Alimentos Ltda. _  alertando-os sobre o teor abusivo das propagandas de McLanche Feliz então veiculadas nas mídias televisivas. A denúncia foi encaminhada ao PROCON no mesmo ano e, em 2011, a multa de R$ 3,192 milhões foi anunciada pelo órgão. O caso arrasta-se até hoje enquanto o juiz concede liminar suspendendo o pagamento por parte da empresa e o desembargador recusa recurso do PROCON. O curioso é que, lateralmente ao caso do McDonald's, o Instituto Alana também apresentou denúncia contra a marca de calçados Grendene sob a mesma alegação do caso anterior (publicidade abusiva), no entanto, o pedido de liminar da empresa não foi aceito.

Segundo a Arcos Dourados, desde 2006 a empresa não vincula à venda dos alimentos os brindes pelos quais a marca adquiriu tanto prestígio entre o público infantil. O abuso, porém, permanece em um segundo nível e, talvez, de uma forma mais requintada e absurda. Segundo nota do Instituto Alana, encaminhada à empresa do dia 15 de agosto de 2013, alguns shows do personagem símbolo da marca são realizados gratuitamente em escolas, creches e hospitais, particulares e públicos. 

Os shows são temáticos e integram uma proposta maior que tem por título "Um Universo de Ciência e Diversão". Em todos, a personagem principal é o palhaço, trajado a caráter e bem acompanhado do "M" arqueado que representa a empresa. O público alvo são as crianças e o ambiente lúdico e, ao mesmo tempo, disciplinar das escolas as conduz, pela autorização dos(as) professores(as) a interagirem e participarem do espetáculo. A agenda dos shows é disponibilizada no site da empresa em uma seção específica sem contato de SAC. Chama a atenção o fato de que os anúncios para os shows a serem realizados em escolas não mencionam o nome da instituição, sequer deixam claro se tratar de escolas, informam apenas apenas seu endereço. 

Em um dos casos citados pela notificação do Instituto Alana, o palhaço se apresenta no Colégio Unisul, em Santa Catarina, e a repórter da UnisulTV menciona que esta apresentação integra um projeto de nome "Ronald McDonald Nas Escolas", em vigor em todos os países onde há a presença da rede McDonald's. É possível visualizar no vídeo o logotipo da empresa nos instrumentos utilizados.

Ronald McDonald em apresentação no Colégio Unisul

Boa vontade ou vontade de ganhar uma boa grana? A questão é que, muito embora esta empresa tenha um público consumidor fiel e suas bases no mercado estejam fixadas a um nível mundial, a possibilidade de queda em qualquer um destes pontos existe, e, neste caso, a publicidade é imprescindível, e, como é sabido, aqui a marca, bem mais que a comida, é o produto a ser vendido. Além do mais, a publicidade em seu formato padrão não foi suficiente para evitar que a empresa permanecesse no vermelho e fechasse suas oito lojas instaladas na Bolívia em 2002.

Trailer do documentário "Por que quebró McDonald's?"



Vyctor Negreiros 
Categoria: Notícias | Visualizações: 1314 | Adicionado por : Negreiros | Data: 2013-08-24 | Comentários (0)

Filipe Augusto Santos*


Fico pensando coisas bobas, como o que eu faria se um gênio me deixasse passar um dia do seu lado de novo, e inclusive, sei o que eu faria se esse dia fosse hoje. Faria coisas de criança. Apareceria numa tarde de domingo e passaria deitado com você. Mas na grama, de um parque ou de um mato qualquer, nos arredores da sua casa, e passaria a tarde sentindo esse Sol d'agora, queimando de leve o nosso rosto enquanto procuramos ver alguma lógica no desenho que Deus fez em cada nuvem.

Te faria perguntas bobas. Que bicho você queria ser? Um bocado de gente queria ser pássaros, o que é uma resposta muito vaga, podendo ir de uma galinha a um avestruz. Te perguntaria essa bobagem, ou melhor, acho que perguntaria. Sei que a pergunta passaria pela minha cabeça, mas não sei se lembraria de perguntar, porque fico muito aéreo quando olho para o céu.

Pense bem antes de escolher que pássaro quer ser, minha pequena. Sei que será difícil ter alguma sombra de dúvida quando um canário rasgar o céu acima de nós, voando apressado, com a confiança que um menino sente em outro menino em tardes de domingo como essas enquanto brincam. Sabe qual o perigo de escolher ser um canário? Canários vivem pouco. Vivem bem uns 5 ou 8 anos. Ok, então não, definitivamente um canário, não. Sabe que pássaro vive muito? Papagaio. Esse sim, vive uns 80 anos fácil, fácil. Parece bem melhor, não é? É, ele voa, vive muito e fala. 

Cuidado quando for escolher que pássaro quer ser, menina de olhos lindos. Papagaios tem essas 3 vantagens, mas não podem realizar as 3. O Papagaio é um bicho fascinante. Inteligentíssimo. Dizem que um papagaio bem esperto, tem a inteligência de um menino de 3 ou 4 anos, mas infelizmente para ele conseguir isso, ele tem que viver com o animal mais baixo que tem. É. Gente.

Sabe por que nós criamos cães, gatos e afins, sem pedir nada em troca? É estranho... Eles podem comer, dormir, dar despesas e nós não esperamos absolutamente nada em troca por parte deles, não cobramos nada, não jogamos na cara. E você vai criar o seu cunhado ou um primo dentro de casa a vida inteira sem cobrar nada? Pense bem. Ele vai comer, beber e dar despesas assim como um cachorro, mas você não vai aturá-lo sabe por que? Porque ele fala. É justamente essa a diferença entre gente e os animais. Nós damos casa e comida pra eles porque eles não falam, não reclamam, não nos julgam. São o exemplo perfeito daquilo de "Pode ficar em casa, mas sem reclamar". Nós amamos a ideia de viver com alguém que nos dá carinho e abana o rabo quando chegamos do trabalho e não nos julga, nem reclama. Amamos tanto que aceitamos dar casa e comida prum cão.

E o papagaio onde fica nisso tudo? Bem, ele podia voar, falar e viver 80 anos. Mas nós sabemos muito bem o que fazer quando tivermos um papagaio em casa. Cortamos suas asas. Bem, já que cortar suas cordas vocais daria muito mais trabalho, vão-se as asas mesmo. E aí está a perdição daquele que escolheu ser um papagaio. Papagaios são tristes. São pássaros e por falarem, tiveram suas asas cortadas assim como todos nós as tivemos um dia. Perderam sua liberdade. E agora estão condenados a viver 80 anos assim, e como se não bastasse, falando. Talvez para ironicamente compreenderem em nossa própria língua e testemunharem em bom português a miséria em que vivemos e somos. 

O canário não. Ele não fala. Ele não teve as asas cortadas e não aprendeu a falar e por isso não perde o seu tempo como nós, advogados e promotores, tendo que escolher quais são as palavras mais bonitas pra se falar o que sente, melhor do que isso: ele canta. Em idioma nenhum. Usa aquela linguagem verdadeira, que sai do coração. Sem enfeites, sem falsidade, nem nada. E que todo mundo entende. O canário voa por cima do meu corpo, do seu, e do céu, atrapalhando a gente enquanto tentávamos desvendar o formato das nuvens, e não dá a mínima pra isso, como aquele menino que rouba as frutas do pé do vizinho, sem vontade fome nenhuma, só para rir da raiva dos adultos que o xingam. Moleque teimoso. Voa apressado para lugar nenhum, aparentemente justamente zombando de nós, aqui presos no chão, mostrando o quão feliz ele é por voar. 

Todos nós nascemos como canários. Mas dura pouco. Com o tempo, nos ensinam a falar e nos podam as asas, enquanto o canário vive sua vida feliz e nós lamentamos não apenas pela nossa, mas pela vida dele, que dura tão pouco. E que exatamente por isso, por ser tão livre, dure tão pouco e pague com a morte, o preço tão caro, de ser tão feliz.


*Graduando em Direito pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI
Categoria: Crônicas | Visualizações: 435 | Adicionado por : Negreiros | Data: 2013-08-21 | Comentários (0)


           

       Assista abaixo ao primeiro podcast do Caderno Polifonias. Este episódio corresponde à fala de Henyo Trindade Barretto Filho, Coordenador do Comitê de Regulamentação da Profissão de Antropólogo da ABA, durante a I Jornada de Ciências Sociais do Maranhão.         

       Henyo Possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1986), mestrado em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1992) e doutorado em Ciência Social (Antropologia Social) pela Universidade de São Paulo (2001). Atualmente é diretor acadêmico do Instituto Internacional de Educação do Brasil. Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Antropologia, atuando principalmente nos seguintes temas: meio ambiente, política indigenista, unidades de conservação, povos indígenas e política ambiental. 



CRÉDITOS

ÁUDIO - May Waddington Telles Ribeiro
EDIÇÃO E VINHETA -Vyctor Gomes de Negreiros Araujo
EFEITOS SONOROS - fonte http://www.freesfx.co.uk

AGRADECIMENTOS

Henyo Trindade Barretto Filho

May Waddington Telles Ribeiro

Categoria: Podcasts | Visualizações: 479 | Adicionado por : Negreiros | Data: 2013-06-27 | Comentários (0)

 
No dia 15 deste mês (maio) foi protocolado com mais de 200 assinaturas , na Câmara dos Deputados, um requerimento para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a atuação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
O requerimento é de autoria de, dentre outros deputados, Alceu Moreira, Luis Carlos Heinze, Jerônimo Goergen, Valdir Colatto e Nilson Leitão, representantes da Frente Parlamentar da Agropecuária.
 
 
Dentre os argumentos que os autores utilizam para justificar o requerimento encontra-se o de que a atuação dos antropólogos envolvidos nos processos de demarcação de terras corrobora uma "manipulação criminosa do processo administrativo" em questão, e cita como exemplo o caso da Reserva Florestal de Mato Preto, no qual o Relatório Circunstanciado é de autoria da antropóloga Flávia Cristina de Melo.
O requerimento menciona a tese de doutoramento de Flávia e refere-se desdenhosamente ao ritual Mbyá Guarani, descreditando a decisão da tribo de mudar-se de Cacique  Doble para Mato Preto pelo fato de ser utilizado em alguns rituais ervas alucinógenas da bebida conhecida como ayahuaska e de um dos motivadores da mudança ser um sonho de Edurado Karai Guaçu, fator que, de acordo com as tradições da aldeia é suficiente para decidir a mudança. Como assegura o parágrafo primeiro do artigo 231 da Constituição Federal de 1988 citado no próprio requerimento: 
 
São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
 
O documento, quando afirma ter existido uma retirada criminosa de quarenta pessoas da reserva, desconsidera as alterações na demarcação de terras na região de Cacique Doble que, em 1942, teve 942 hectare expropriados para em seguida serem transformados em lotes coloniais.
Além de negligenciar para um segundo plano os conflitos entre os guarani e os vizinhos kaingang, principal motivador da mudança, o requerimento desrespeita os trabalhos realizados pelos antropólogos afirmando que "para realização dos seus intentos, os antropólogos não têm qualquer limite ético, jurídico ou mesmo de respeito às pessoas atingidas ilicitamente por seu agir temerário, fraudulento e tirânico".
Ao que parece, esta CPI procura simplesmente invalidar os esforços de antropólogos como Flávia Cristina de Melo que, contrariamente à qualquer parecer desavisado e totalmente interessado, engendram-se em uma pesquisa demorada e rigorosa respeitando os cânones da objetividade científica nas fronteiras de uma etnografia comprometida com a preservação da intimidade dos povos estudados, que, bem mais que um trabalho de transcrição da realidade observada é um processo de criação da voz de uma minoria emudecida pelos interesses desenvolvimentistas de alguns políticos.
Os reais interessados na instalação desta CPI integram a bancada ruralista, um dos grupos mais atuantes no Congresso, composta de 23,4% da câmara de de 16% do senado, sendo que, na câmara, a Frente Parlamentar de Agropecuária afirma influenciar pelo menos 41% dos votos.
Seguem abaixo os documentos referidos no texto e o texto do antropólogo Oscar Saez sobre o requerimento:
 
Vyctor Gomes de Negreiros Araujo.
Graduando em Ciências Sociais pela UFPI

 

Categoria: Notícias | Visualizações: 692 | Adicionado por : Negreiros | Data: 2013-05-26 | Comentários (0)